Escolha uma Página
Espalhe a notícia

O ImprenÇa passou a madrugada desta quinta-feira (5) na ALESP ocupada por estudantes. A aula hoje, é na ALESP.

São 16h quando deixo o escritório em direção a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo {{ALESP}}, sem saber exatamente como entrar na plenária que está ocupada desde o dia 3 de maio pelos estudantes secundaristas em protesto pela ausência de investigações sérias a respeito da máfia das merendas {{que este blog já falou nesta postagem aqui}}.

Na porta da ALESP a primeira barreira, dois policiais questionam de onde vim, para onde vou, se o céu é azul, se o ovo nasceu primeiro ou se foi a galinha… E eu falo alguma coisa que já nem sei, quero entrar, não quero falar. Seja o que for, deixaram.

Ligo para o fotógrafo e aviso por onde entrei e como entrei. Não se deixa companheiro para trás. Foi a primeira coisa que aprendi na militância. Ele entra e agradece. Aparentemente o meu blá blá blá funcionou bem o bastante para que a PM não o perturbasse.

Fomos fazer uma credencial provisória, já que nos deixaram entrar, vamos legalmente. Na sala T54 dois jornalistas, jovens o bastante para serem secundaristas {{o que será que pensam eles disso tudo?}} nos atendem de forma bastante simpática. Haverá uma coletiva, nos informam, do chefe de Gabinete do presidente da ALESP, João Borro.



Apoie o Jornalismo Independente

Ele quer falar sobre a reintegração de posse. Os urubus todos lá, globo, record, bandeirantes, etc {{devia usar maiúsculas?}}. A coletiva não diz muito além de que a reintegração de posse foi concedida. Os estudantes têm 24h contadas a partir das 16h45 do dia 5 de maio de 2016 para desocupar a ALESP. Ou serão multados em 30 mil reais. Individualmente {{Capez quer recuperar o que roubou, será?}}. O sujeito {{João Borro}} que fala a minha frente me lembra Wilson Fisk {{o Rei do Crime, do seriado Demolidor}} e eu já começo a ouvir como um mantra as bobagens que ele fala {{há quanto tempo eu não durmo?}}. Até que uma me salta os ouvidos {{ou seriam os olhos?}}: “daqui há pouco o movimento dos ‘sem mamadeira’ vai querer ocupar aqui também”.

ALESP ocupada

4 horas se passam desde a coletiva até a nossa entrada na plenária. Muita conversa com os veículos urubus, o suficiente para me lembrar que são pessoas em seus trabalhos {{seria o dinheiro, a fama ou a ausência completa de ideologia que os faz trabalhar para patrões tão sem caráter?}}, que como eu estão cansadas. Que já não nos lembramos mais a última noite completa de sono.

Entramos e conversamos rapidamente com Camila Lanes, que nos deixa bastante a vontade para escrever e dizer aquilo que bem quisermos. Pede o óbvio, tão necessário para estes tempos. “tenham bom senso”, diz ela. E eu acho justo. E digno.

Nos últimos meses estive com manifestantes favoráveis e contrários ao golpe. Estive em Brasília vendo o choro dos que apoiam a democracia diante da infâmia que foi chamada de votação. Estive em escolas ocupadas por secundaristas. Estive em manifestações inúmeras. E ao entrar no plenário me recordo do quanto não quis ser jornalista. E o quanto os urubus me empurraram a escrever.

Volto à realidade e o que assisto é uma cena absolutamente linda.

Pausa para lembranças do escritório

Na tarde desta quinta-feira (5) Luiza Erundina, aproveitando que as sessões na Câmara foram encerradas pelo afastamento de Eduardo Cunha {{e a covardia de seu vice}}, assumiu a presidência de uma sessão ‘clandestina’, na qual parlamentares que fazem jus ao cargo falaram sobre as minorias, sobre os direitos dos trabalhadores, sobre democracia

Fim da pausa para lembranças do escritório

Entro e sou informado de que ocorre na ALESP nesse momento é uma sessão extraordinária com representantes de diversos partidos fictícios. Está falando o líder da bancada do Partido Mete o Loco do Brasil. Seguido pela líder do Partido das Macumbeiras Socialistas. As falas são dignas de qualquer plenário do planeta. Ao contrário, alguns plenários não são dignos dos discursos que os secundaristas fazem. “Pela liberdade religiosa”. EPA. Não é a liderança que fala, é um frei.

Frei Agostino, 42 anos. Ele faz parte da Comunidade Voz dos Pobres {{Igreja Católica}}. Conversadeiro, conta que é curioso e que já conversou com diversos ocupantes {{de ocupações de habitação}}. Conheceu os secundaristas no que ficou conhecido como “Primavera Secundarista”, mas que agora terá de ser chamado “Primeira Primavera Secundarista”. Conheceu os estudantes do Fernão Dias. “Cheguei aqui no dia 4, para ficar 10 minutos e estou até agora”. Agora, no caso, 0h de quinta-feira (5).

Entrou porque estava preocupado com a integridade física dos estudantes. Conta que ficou chocado com a quantidade de ‘carteiradas’ que viu durante as 7 horas que aguardou até entrar no plenário. E disse o óbvio, tão necessário: “Um absurdo a forma como são tratados os estudantes. Têm de lutar de verdade numa guerrilha de verdade”.

Mas não hoje. Hoje, pouco antes de conversar com o Frei, uma roda com violão ao fundo do plenário {{a cultura tem lugar na política?}} toca legião urbana. Que país é este? Pouco antes da música um jogo de mímicas reúne a turma. Pouco depois ALESP Fashion Week, com um desfile de cobertores.

ALESP Ocupada

Volto ao mundo real quando vou ao banheiro. Um grupo se amontoa na frente da janela que dá para a rua. Ali, na rua. Fora do bunker, fora da sessão extraordinária, fora desta bolha de cultura, criatividade, discussões e risos que se transformou a ALESP; um grupo faz um jogral em apoio à ocupação. Eles choram, comemoram. Eu sinto escorrer uma lágrima {{deve ser o cansaço, repórter não chora…}}.

Converso com Maria Beatriz, 18 anos, de Sorocaba. Ela conta que a família sempre fez parte do movimento estudantil, que a bisavó era diretora da UNE, na época da ditadura, teve a casa queimada durante a época da ditadura. Ela foi presidente de grêmio estudantil na escola. Veio para São Paulo participar de uma “discussão de gênero” {{a desculpa oficial para unir secundaristas que ocuparam a ALESP}}.

ALESP ocupada

{{foto: Gustavo Oliveira / Democratize}}

A história de Maria Beatriz é muito semelhante a de Chrystopher Ravena, 18 anos, daqui da capital de Merendópolis. Seus familiares também têm histórico de luta. Também conheceu as “instituições oficiais” {{UPES, UBES, etc.}} durante as ocupações. Dois exemplos de luta. E eu imaginando o que serão os dois aos 30 anos. Estarão ocupando o senado? Ou serão ocupantes oficiais destas instituições?

Seja como for, o presente da luta política está na ALESP. As cadeiras outrora meros recipientes de bundas {{e estas meros recipientes de corpos igualmente bundas, com as devidas exceções, é claro}}.

O texto acaba mas a noite continua. E o escriba que não queria ser jornalista hoje agradece a sorte que tem de assistir a tantas aulas.

Quando eu crescer, quero ser secundarista.

Espalhe a notícia